quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

my hero

Pai!
Eu não faço questão de ser tudo
Só não quero e não vou ficar mudo
Prá falar de amor
Prá você...

Pai!
Senta aqui que o jantar tá na mesa
Fala um pouco tua voz tá tão presa
Nos ensine esse jogo da vida
Onde a vida só paga prá ver...

Pai!
Me perdoa essa insegurança
Que eu não sou mais
Aquela criança
Que um dia morrendo de medo
Nos teus braços você fez segredo
Nos teus passos você foi mais eu...

Pai!
Eu cresci e não houve outro jeito
Quero só recostar no teu peito
Prá pedir prá você ir lá em casa
E brincar de vovô com meu filho
No tapete da sala de estar
Ah! Ah! Ah!...

Pai!
Você foi é herói meu bandido
Hoje é mais
Muito mais que um amigo
Nem você nem ninguém tá sozinho
Você faz parte desse caminho
Que hoje eu sigo em paz
Pai! Paz!...

I believe

Na verdade, agente sempre tem algo para se acreditar. Agente vive de espectativas o tempo inteiro, e mesmo assim acreditamos que vai ser assim e assim. Acreditar que tudo vai mudar, e que as pessoas que você ama não se vai embora. Acreditar que talvez o seu 'pra sempre' possa ser mesmo pra sempre. Acreditar que amigos não se perdem, que os amigos não traem, nem magoam. Acreditar que seu namorado vai ser seu, sempre. Acreditar que traição é uma coisa que existe só com suas amigas e nunca com você. Acreditar que um dia você vai entrar numa faculdade, vai se formar, vai ter um bom emprego e as vezes se casar. Acreditar que um dia vou poder falar de sexo com meus pais. Acreditar que um dia vou ver meus pais juntos. Acreditar em Deus, mais qual Deus? Acreditar na sua capacidade, na sua força de vontade e na persistencia. Acreditar mais em você do que nas outras pessoas. Acreditar que você nunca vai ser assaltado, que nunca vai sofrer um acidente ou ficar doente. Acreditar que ele te ama. Acreditar que pessoas legais que moram longe, um dia vai morar perto de você. Acreditar que você nunca vai brigar com sua melhor amiga. Acreditar que você tem ou acredita ter, na verdade, apenas alguns ou um amigo. Acreditar que música ajuda a limpar a alma. Acreditar que ficar triste, magoada e recentida é perda de tempo. Acreditar que você tem valor, e você tem que se da ao valor. Acreditar que família é sagrada, única, e vão estar sempre com você. Acreditar que você não vai ficar careca, ou com cabelos brancos. Acreditar que você vai voltar naquele lugar um dia. Acreditar que você vai comprar um animal de estimação, outra vez. Acreditar que sexo tem mais a ver com amor, do que com sexo em si. Acreditar que amor não se descreve, não se traduz, apenas se vive. Acreditar que é preciso viver, sair, dançar, fazer festa. Acreditar que você ainda pode descer até o chão. Acreditar que você vai beber todas e não vai cair. Acreditar que o tempo não cura, apenas distrai o incurável dos centro das atenções. Acreditar que você precisa ver as notícias, ler jornal e se atualizar. Acreditar que livros não são folhas empoeiradas. Livros libertam. Acreditar que você não vai morrer. Acreditar que seus irmãos vão precisar de você. Acreditar que irmãos são a melhor ponte com seu passado, e possivelmente quem vai te ajudar no futuro. Acreditar que as avós são tudo e mais um pouco. Acreditar que você vai receber uma mensagem por telefone no dia do seu aniversário. Acreditar que depois dos 15 o tempo voa. Acreditar que um dia você tem que ter responsabilidade, maturidade e cabeça aberta pra encarar a vida. Acreditar que namoro a distancia não da certo. Acreditar que você vai viajar o mundo inteiro, em alguns dias. Acreditar que não é preciso chorar, chingar e resmungar. Reclame menos. Acredite que o mundo possa acabar, e faça algo para isso não acontecer. Acredite que você tem tudo e nada. Acreditar que seu cabelo está lindo. Acreditar que alguém acredite em você. Acreditar, crer, e ter fé. Isso basta.

Clarice Lispector - Felicidade Clandestina

Ela era gorda, baixa, sardenta e de cabelos excessivamente crespos, meio arruivados. Tinha um busto enorme; enquanto nós todas ainda éramos achatadas. Como se não bastasse, enchia os dois bolsos da blusa, por cima do busto, com balas. Mas possuía o que qualquer criança devoradora de histórias gostaria de ter: um pai dono de livraria.

Pouco aproveitava. E nós menos ainda: até para aniversário, em vez de pelo menos um livrinho barato, ela nos entregava em mãos um cartão-postal da loja do pai. Ainda por cima era de paisagem do Recife mesmo, onde morávamos, com suas pontes mais do que vistas. Atrás escrevia com letra bordadíssima palavras como "data natalícia" e "saudade".

Mas que talento tinha para a crueldade. Ela toda era pura vingança, chupando balas com barulho. Como essa menina devia nos odiar, nós que éramos imperdoavelmente bonitinhas, esguias, altinhas, de cabelos livres. Comigo exerceu com calma ferocidade o seu sadismo. Na minha ânsia de ler, eu nem notava as humilhações a que ela me submetia: continuava a implorar-lhe emprestados os livros que ela não lia.

Até que veio para ela o magno dia de começar a exercer sobre mim uma tortura chinesa. Como casualmente, informou-me que possuía As reinações de Narizinho, de Monteiro Lobato.

Era um livro grosso, meu Deus, era um livro para se ficar vivendo com ele, comendo-o, dormindo-o. E completamente acima de minhas posses. Disse-me que eu passasse pela sua casa no dia seguinte e que ela o emprestaria.

Até o dia seguinte eu me transformei na própria esperança da alegria: eu não vivia, eu nadava devagar num mar suave, as ondas me levavam e me traziam.

No dia seguinte fui à sua casa, literalmente correndo. Ela não morava num sobrado como eu, e sim numa casa. Não me mandou entrar. Olhando bem para meus olhos, disse-me que havia emprestado o livro a outra menina, e que eu voltasse no dia seguinte para buscá-lo. Boquiaberta, saí devagar, mas em breve a esperança de novo me tomava toda e eu recomeçava na rua a andar pulando, que era o meu modo estranho de andar pelas ruas de Recife. Dessa vez nem caí: guiava-me a promessa do livro, o dia seguinte viria, os dias seguintes seriam mais tarde a minha vida inteira, o amor pelo mundo me esperava, andei pulando pelas ruas como sempre e não caí nenhuma vez.

Mas não ficou simplesmente nisso. O plano secreto da filha do dono de livraria era tranquilo e diabólico. No dia seguinte lá estava eu à porta de sua casa, com um sorriso e o coração batendo. Para ouvir a resposta calma: o livro ainda não estava em seu poder, que eu voltasse no dia seguinte. Mal sabia eu como mais tarde, no decorrer da vida, o drama do "dia seguinte" com ela ia se repetir com meu coração batendo.

E assim continuou. Quanto tempo? Não sei. Ela sabia que era tempo indefinido, enquanto o fel não escorresse todo de seu corpo grosso. Eu já começara a adivinhar que ela me escolhera para eu sofrer, às vezes adivinho. Mas, adivinhando mesmo, às vezes aceito: como se quem quer me fazer sofrer esteja precisando danadamente que eu sofra.

Quanto tempo? Eu ia diariamente à sua casa, sem faltar um dia sequer. Às vezes ela dizia: pois o livro esteve comigo ontem de tarde, mas você só veio de manhã, de modo que o emprestei a outra menina. E eu, que não era dada a olheiras, sentia as olheiras se cavando sob os meus olhos espantados.

Até que um dia, quando eu estava à porta de sua casa, ouvindo humilde e silenciosa a sua recusa, apareceu sua mãe. Ela devia estar estranhando a aparição muda e diária daquela menina à porta de sua casa. Pediu explicações a nós duas. Houve uma confusão silenciosa, entrecortada de palavras pouco elucidativas. A senhora achava cada vez mais estranho o fato de não estar entendendo. Até que essa mãe boa entendeu. Voltou-se para a filha e com enorme surpresa exclamou: mas este livro nunca saiu daqui de casa e você nem quis ler!

E o pior para essa mulher não era a descoberta do que acontecia. Devia ser a descoberta horrorizada da filha que tinha. Ela nos espiava em silêncio: a potência de perversidade de sua filha desconhecida e a menina loura em pé à porta, exausta, ao vento das ruas de Recife. Foi então que, finalmente se refazendo, disse firme e calma para a filha: você vai emprestar o livro agora mesmo. E para mim: "E você fica com o livro por quanto tempo quiser." Entendem? Valia mais do que me dar o livro: "pelo tempo que eu quisesse" é tudo o que uma pessoa, grande ou pequena, pode ter a ousadia de querer.

Como contar o que se seguiu? Eu estava estonteada, e assim recebi o livro na mão. Acho que eu não disse nada. Peguei o livro. Não, não saí pulando como sempre. Saí andando bem devagar. Sei que segurava o livro grosso com as duas mãos, comprimindo-o contra o peito. Quanto tempo levei até chegar em casa, também pouco importa. Meu peito estava quente, meu coração pensativo.

Chegando em casa, não comecei a ler. Fingia que não o tinha, só para depois ter o susto de o ter. Horas depois abri-o, li algumas linhas maravilhosas, fechei-o de novo, fui passear pela casa, adiei ainda mais indo comer pão com manteiga, fingi que não sabia onde guardara o livro, achava-o, abria-o por alguns instantes. Criava as mais falsas dificuldades para aquela coisa clandestina que era a felicidade. A felicidade sempre iria ser clandestina para mim. Parece que eu já pressentia. Como demorei! Eu vivia no ar… Havia orgulho e pudor em mim. Eu era uma rainha delicada.

Às vezes sentava-me na rede, balançando-me com o livro aberto no colo, sem tocá-lo, em êxtase puríssimo.

Não era mais uma menina com um livro: era uma mulher com o seu amante.
É claro dizer que não importa a verdade, as pessoas vêem o que elas querem ver. Algumas pessoas podem dar um passo para trás e descobrir que elas estavam olhando a mesma grande figura todo o tempo. Algumas pessoas podem ver que suas mentiras quase o alcançaram. Algumas pessoas podem ver que elas estavam lá o tempo todo. E, em seguida há essas outras pessoas, os que correm na medida do possível para que não precisem olhar para si. E para mim? eu posso ver claramente agora.

sábado, 2 de janeiro de 2010

Estamos na era do fast-food e da digestão lenta, do homem grande de caráter pequeno, lucros acentuados e relações vazias. Essa é a era de dois empregos, vários divórcios, casas chiques e lares despedaçados. Essa é a era das viagens rápidas, fraldas e moral descartáveis, das rapidinhas, dos cérebros ocos e das pílulas 'mágicas'. Um momento de muita coisa na vitrine e muito pouco na dispensa.